Eu acho que isso das identidades “falsas” não é assim algo tão disseminado nem tão importante. Foi uma prática muito mais frequente nos inícios da Internet, talvez pela novidade da coisa, mas que aos poucos se foi estabilizando. É evidente que em alguns contextos a sua presença é notória, mas em muitos casos as pessoas tentam projectar nas comunidades em que participam na Net aquilo que percebem como o seu verdadeiro eu, a sua essência como pessoas. Na sua vida real isso por vezes é muito difícil (por razões de aparência física, de contexto de vida, de constrangimentos sociais, etc.), mas o relativo anonimato e a maior fluidez dos conntextos sociais na Internet tornam isso possível.
Depois, resulta claro do texto do Spears que a experimentação de outras formas de ser e agir – uma espécie de experimentação dos contornos, limites e possibilidades da identidade de cada um – podem resultar em consequências positivas ou negativas. É positivo quando as pessoas desenvolvem esse processo numa perspectiva de aprofundamento pessoal, integrando essas experiências aos poucos nas suas formas de ser e agir no mundo real. É negativo quando o fazem de uma forma “esquizofrénica”, criando identidades que não emergem da sua autenticidade e que não são integráveis nas suas estruturas cognitivas, emocionais e afectivas. Aí sim, aparecem os perigos de que falas, de confusão identitária e de confusão, não entre o real e o virtual, mas entre o real e o ficcional.
Quanto à questão da coesão ser maior ou menos superficial na Internet, um dos aspectos que acho mais interessantes no texto de Spears é que, relativamente a esta como a outras questões, os estudos são muito contraditórios, e apontam para os perigos de generalizações, ao mesmo tempo que sugerem que estes problemas podem, em contextos diversos, ter respostas diversas. Se em alguns casos essa coesão é mais superficial, noutros será, pelo contrário, bem mais profunda. Isso dependerá do contexto, das características pessoais dos actores envolvidos e das circunstâncias em que se desenrolam as suas relações virtuais. Evidentemente que se falarmos de relações amorosas, as virtuais são obviamente incompletas e parciais, porque aí o elemento físico tem uma importância decisiva e a sua validação só pode ser feita pelo confronto com o real. Mas se falarmos de amizade, cumplicidade, afinidade, empatia, partilha de ideias ou ideais, etc, acho, como disse antes, que o grau de solidez ou de autenticidade pode ser menor, igual ou superior na Net. Tudo depende.